Para os mais formais, ela lembra o nome da capital do Brasil e berço da política tupiniquim.

Mas, para outros tantos brasileiros esse carro foi eternizado pela alegria e irreverência do grupo musical Mamonas Assassinas, quando agitavam os fãs com “Minha Brasília amarela/Tá de portas abertas/Pra mode a gente se amar”.

E é sobre a Volkswagen Brasília que vamos falar nas próximas linhas.

Volkswagen Brasília

Quem materializou a idéia da Brasília foi Rudolph Leiding, presidente da Volkswagen do Brasil no início da década de 70. Rudolph era alemão e, antes mesmo da Brasília ser lançada, ele havia conquistado o posto de presidente da Volks em escala mundial.

Mesmo longe, Rudolph viu seu sonho realizado: criar um sucessor para o Fusca. O lançamento aconteceu em 1973. O principal concorrente da Brasília naquele período era o Chevette. No páreo também estavam o Dodge 1800 da Chrysler e o Maverick da Ford.

Um carro compacto, prático e econômico, com traços europeus. Assim foi definido o novo Volkswagen Brasília. O objetivo era proliferá-lo nos centros urbanos, sem perder da lembrança a robutez do seu antecessor, o famoso Fusca.

Inicialmente, a imprensa o apelidou como "miniperua VW", ou ainda "míni-Variant". Entretanto, as linhas mais modernas e retas a diferenciaram da Variant. Outro detalhe que chamava atenção era a ampla área envidraçada, pois garantia uma excelente visibilidade em todas as direções.

Com cerca de quatro metros de comprimento, o que equivale a 17 cm menos que o Fusca, a Brasília sempre chamava atenção.

Em meio à loucura do trânsito diário, permitia fácil manobra, uma característica comum entre os carros urbanos da Europa.

Terceira porta

Volkswagen BrasíliaA Volkswagen idealizou uma estratégia comercial para feminizar a sua nova criação: uma terceira porta. Com ela, o carro pôde ser classificado como perua (por isso, a Brasília) e, para a alegria de muitos, teve redução nos impostos, tendo sido classificada como utilitário.

Na prática, a Brasília mantinha apenas dois-volumes, da mesma forma que o Fiat 147 e o Gol.

A parte frontal contava com quatro faróis redondos, de fachos altos e baixos. Já as luzes direcionais, foram colocadas através de embutimento no pára-choque, composto por lâmina cromada.

Havia uma harmonia e equilíbrio no design. As entradas de ar foram instaladas abaixo do grande vidro lateral e auxiliavam na refrigeração do motor. Abaixo do pára-choque, próximo à traseira, o silenciador ficava escondido por uma grade, com saída única direcionada para a esquerda.

O conforto não era o único atrativo da Brasília, mas sim o fato dela permitir essa sensação para quatro ou até cinco passageiros. Aí estava seu grande trunfo!

Como tudo na vida tem dois lados, perdíamos quando o assunto eram as malas. É que a bagagem não poderia ser colocada no compartimento dianteiro. A Brasília não disponibilizava um segundo porta-malas atrás do banco traseiro, como fez o Fusca. Em meio a essa dificuldade, as bagagens iam parar sobre a tampa do motor! O que era um risco eminente quando registradas freadas bruscas ou colisões dianteiras.

E as improvisações não paravam por aí. O porta-malas comportava o estepe e, no teto, funcionava um bagageiro. A moda “pegou”, naquela época, e outros modelos utilizaram a mesma estratégia para ampliar a capacidade de carga.

Na parte interna da Brasília, uma simplicidade agradável. Velocímetro, marcador de nível de combustível e opcionalmente um relógio compunham o painel.

Com 40 cm de diâmetro, tínhamos um adequado volante e, na tampa do cinzeiro, um esquema que indicava a posição das marchas.

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O custo da Brasília ficou um pouco acima do Fusca, mas os bancos não apresentavam tantas novidades e o carro ainda contava com motor traseiro refrigerado a ar, entre eixos de 2,4 metros. Para alguns especialistas, era a mecânica do Fusca dentro de uma versão mais moderna e funcional.

No motor, quatro cilindros opostos, 1,6 litro e um carburador garantiam a potência bruta de 60 cv. De acordo com os brasilienses fanáticos, a localização do motor junto às rodas motrizes permitia milagres em percursos fora de estrada e em subidas escorregadias. A aderência e a tração eram garantias da máquina, que também era considerada econômica ao rodar 14 km/l.

Para reduzir os custos de produção, a Volks também apostou em uma tática diferenciada: uma turbina de refrigeração alta, de fluxo radial, em vez da baixa, diretamente no virabrequim e de fluxo axial da Variant. Com a mudança, perdeu-se a possibilidade de um porta-malas traseiro, tornando o modelo mais curto.

Uma das explicações para o melhor desempenho da Brasília em relação ao Fusca estaria no tipo de chassi-plataforma específico, com maior largura, assim como as bitolas. Uma barra compensadora traseira estava aplicada a toda linha de ar. Ela agia em sentido oposto à barra estabilizadora tradicional e diminuía a saída de traseira (sobresterço).

Se colocada na pista com os concorrentes (Chevette e o Dodge 1800), a Brasília emparelhava no primeiro momento, devido à qualidade do torque em baixa rotação e da tração superior. O problema começava quando a terceira marcha era engatada, mas sempre se garantia 0 a 100 km/h em 23 s e 132 km/h. Para o cenário daquele período, nada mal.

Nove anos de idade

Durante os seus nove anos de vida, 950 mil unidades estiveram na praça brasileira. Algumas Brasílias também foram exportadas para outros países da América do Sul e até para a África.

A Volkswagen Brasília soube conquistar o seu público. Paulatinamente, o veículo inovou e conseguiu ampliar o desempenho. Como aconteceu em 1976, quando assegurou dois carburadores de corpo simples e elevou a potência para 65 cavalos. As vendas eram promissoras, pois o cliente comprava o seu modelo e levava de imediato. Em quase 10 anos, houve melhorias na aceleração, velocidade máxima e principalmente no consumo gerado pelo carro.

Para quem preferisse a opção de um só carburador, ela também permaneceu no mercado por algum tempo. Reza a lenda que os dois carburadores deixavam o nível de barulho extremamente alto dentro do veículo. A Volks tentou melhorar a situação, mas não teve muitos avanços.

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Algumas mudanças também eram solicitações do Conselho Nacional de Trânsito (Contran).

As inovações não paravam, inclusive entre os concorrentes. A Fiat, em 1976, lançou o modelo 147 e, em 1978, a Brasília incorporou porta-luvas com tampa, painel com acabamento similar a madeira e novidades no estofamento.

Um duplo circuito modificou o sistema de freios e a coluna de direção permitiu maior proteção em casos de impactos.

Em 1979, dois ressaltos sobre o capô, novas lanternas traseiras marcadas por um desenho frisado e pára-choques com ponteiras de plástico nas laterais. Mudanças que garantiam melhor visibilidade.

O acionador da buzina foi redesenhado e o desembaçador elétrico passou a ser opcional no vidro traseiro. Ainda em 1978 foi lançada a Brasília com cinco portas, com unidades para exportação. O tamanho foi mantido, mas uma terceira janela na lateral foi muito bem recebida pelos taxistas.

A linha 1980 inovou com pára-choques de ponteiras em plástico, novo painel e bancos e lanternas traseiras frisadas.

A Brasília LS foi considerada uma versão mais sofisticada, com painel em plástico injetado e mais instrumentos, a exemplo de um grande relógio, velocímetro com hodômetros total e parcial, marcador de combustível e vacuômetro. Este último também ajudava o motorista na economia de combustível.

Encostos de cabeça instalados nos bancos anatômicos, um descansa-braço, carburadores com novos elementos filtrantes, e uma opção a álcool, com 1,3 litro e potência líquida de 49 cv. Era a Brasília tentando inovar para manter-se no mercado cada vez mais concorrido.

No meio da crise

Os anos de ouro do Volkswagen Brasília foram prejudicados por uma crise nada legal. A chamada crise do petróleo, em 1973, fechou postos de gasolina e fez com que o preço do combustível ficasse inatingível pelo consumidor padrão.

A história revela que, três anos depois do choque do petróleo de 1973, a situação teria ficado insustentável. O governo inicialmente apostou na solução do racionamento. A decisão, entretanto, não levou em conta que o Brasil não dispunha de outro álcool carburante. As opções, naquele momento, eram o diesel e a gasolina.

A segunda alternativa foi a de utilizar o diesel exclusivamente em caminhões e ônibus. Isso porque esses veículos não tinham dificuldade de manter a autonomia já que mantinham os tanques quase sempre avantajados.

O inverso acontecia com os automóveis comuns, cujos tanques na maioria das vezes, seguiam os volumes dos modelos produzidos nos países de origem. É o caso do Passat, que, por exemplo, demandava 45 litros de combustível no tanque. Alguns anos depois, chegou a exigir 60 litros. Em um contexto como esse, manter um automóvel ficava quase impossível e os consumidores deixaram seus veículos guardados. Com isso, os postos de gasolina ficaram em verdadeiros apuros.

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Feitas sob medida

O Volkswagen Brasília caiu nas graças do brasileiro. E tal foi a paixão que até modelos conversíveis foram produzidos no país. A concessionária paulista Marcas Famosas desenvolveu um modelo bastante diferenciado, que aproveitou bem as características do veículo. O Brasília Cabriolé contava com um grupo ótico dianteiro, inspirado no modelo Passat e apostava em faróis de neblina, rodas de liga leve e pintura metálica.

Outros diversos modelos desenvolvidos pela concessionária Dacon, também de São Paulo, traziam as mais diversas opções em acabamento e potência para o motor. Em alguns, dupla carburação de 32 mm a 40 mm e comando de válvulas especial. A concessionária ainda garantia velocidade máxima de 145 km/h e 0 a 100 km/h em 15,2 s.

Modelos mais ousados garantiam 1,7-litro e a versão mais atrevida, com 1,8 litro, que marcava 150 km/h e 100 km/h em 14 s.

Se comparado com os modelos V8 e de seis-cilindros nacionais, o rendimento era relativamente bom, pois esses outros modelos alcançavam a mesma marca com um tempo entre 11 e 12 s.

Profissionais especializados e de competência comprovada atuavam para o desenvolvimento dos modelos especiais da Volkswagen Brasília, sempre com o objetivo de aperfeiçoar o rendimento dos motores. Na Dacon, até mesmo um molde do famoso Porsche foi aplicado ao modelo da Brasília. Era uma verdadeira transformação mecânica.

A Matis, uma terceira empresa especializada em transformações de carrocerias, apostou em uma Brasília inspirada na Baja Buggy, modelo originalmente desenvolvido sobre o Fusca.

Comercial

Confira um comercial, veiculado em 1973, da Volkswagen Brasília:

A chegada do Gol

Aparentemente não havia crise nas vendas da Brasília... Mas, para a surpresa de muitos, a Volks lançou o Gol. E quem começou a tirar a Brasília de cena foi esse próprio modelo da Volkswagen, lançado em maio de 1980.

Bastaram dois anos, para em março de 1982, a Brasília fechar o seu ciclo de vida. O que teria levado a Volkswagen a lançar o Gol, no momento em que a Brasília ainda estava sendo bastante solicitada?

Para alguns estudiosos, teria sido o fato dela não ter criado “família”. Ter sido apenas uma estrela solitária, de uma única versão.

Os próprios concorrentes, Chevette, Corcel II e Fiat 147, também tinham versões diferenciadas.

A ausência de uma nova versão da Brasília para ser “lançada” também dificultou na chegada de investimentos para o veículo, que durante toda a sua trajetória apresentou alterações menores.

De novidade mesmo, só a versão quatro portas, bastante aplaudida pelos taxistas, mas que não chamou tanta atenção do público em geral.

O Gol apostava na sofisticação, com toques mais modernos e terminou por se impor no mercado brasileiro. Por mais que a Brasília tentasse inovar com alguns equipamentos, não conseguiu se manter.

Mas, o famoso “Besouro” ainda teve algumas unidades produzidas até 1986. De acordo com estudiosos, outros modelos foram criados na década de 90, entre 1993 e 1996.

Se observarmos bem, mesmo depois dessas três décadas, vamos encontrar algumas Brasílias nas praças do Brasil, mais comumente em cidades interioranas.

Hoje, a Brasília já é considerada um carro com status de clássico e, se você tiver um modelo bem conservado, pode garantir uma boa cotação no mercado de usados. Os clubes de veículos também contam com muitos apreciadores do modelo.

Recentemente, a Hot Wheels divulgou que vai transformá-la em miniatura, como já aconteceu com o modelo Volkswagen SP2.