O frisson em torno dos utilitários esportivos acabou respingando positivamente na Troller. A marca, que pertence à Ford desde 2007, tem apenas um modelo, o jipe curto T4, e atua em um nicho muito limitado: o de veículos para trilhas pesadas. São carros com vocação tão determinada e construídos de forma tão específica que dificilmente conseguiria “pescar” consumidores de outros segmentos. Mas a moda de SUVs fez com que o lado esportivo fosse despertado em quem acreditou nas façanhas off-road dos modelos oferecidos – na grande maioria, crossovers. A Troller resolveu então fazer o caminho inverso. Acrescentou acessórios que acentuam o lado off-road do modelo e instalou alguns itens de conforto que tornaram o T4 mais palatável aos clientes oriundos de crossovers. Foi assim que nasceu a versão Bold.
O T4 Bold teve uma primeira edição de 180 unidades em novembro do ano passado, que foi toda vendida em dois meses. Não é pouco para um carro que emplaca, em média, 120 unidades mensais. Por isso, a montadora decidiu fazer um segundo lote, também de 180 unidades. Por fora, pode-se identificar o T4 Bold pelas rodas pretas de 17 polegadas, pelo snorkel e pela carroceria em dois tons, no estilo saia e blusa. Abaixo da linha de cintura, pode ser amarelo, vermelho ou branco. Dela para cima, é sempre em cinza escuro. Na junção das duas cores, há um adesivo em forma de rabisco e a inscrição “Bold” sobre o para-lama traseiro. A tampa traseira e os acessórios externos, como snorkel e estribo, também são em cinza escuro.
Por dentro, console e paineis frontal e de portas também recebem acabamento em cinza escuro. No console frontal, foi instalada uma central multimídia Kenwood com tela de 7 polegadas sensível ao toque. Ela conta com navegador GPS Garmin, discagem por comando de voz, DVD, conexão Bluetooth e USB. Estes equipamentos se somam a outros de série, como ar digital “dual zone”, vidros e espelhos elétricos e teto solar duplo de vidro. Valendo-se de um cochilo da legislação em relação a veículos off-road, não há airbags no T4. Apenas ABS.
Mecanicamente, o T4 não traz novidades e manteve a política de compartilhamento de peças com a picape Ford Ranger. O motor é o mesmo 3.2 litros turbodiesel de cinco cilindros e 20 válvulas da picape, que rende 200 cv de potência e 48 kgfm de torque. O motor é gerenciado por uma transmissão de seis marchas. Mais que suficiente para animar o carrinho, que apesar de pequeno tem mais de 2.100 kg.
Para as escapadas off-road, o Troller tem ótimos recursos. Em modo normal,a tração é 4X2 traseira, mas conta ccom 4X4 e reduzida de acionamento elétrico através de um botão no console. Ela é distribuída por dois diferenciais, sendo que o traseiro tem escorregamento limitado. Os ângulos de entrada e de saída têm 51º, com capacidade de transposição de rampas 27º, ou 30%, e inclinação lateral de até 40º. A capacidade de imersão é de 80 cm. Todas estas qualidades extrapolam, e muito, o aventureiro aspiracional. E o preço, a partir de R$ 127.088, deixa claro que não é apenas um briquedo. A versão Bold deve ficar R$ 7 mil mais cara – a marca avalia os equipamentos adicionados em R$ 10 mil.
O T4 é feito em uma pequena, mas moderna, linha de produção em Horizonte, no Ceará. Lá se produz integralmente a carroceria, que é feita a partir de um compósito de fibra de vidro com aço, semelhante à utilizada em modelos superesportivos, como os da Lamborghini. Essa massa é prensada a quente e aumenta a resistência a choques e arranhões. A capacidade da fábrica é de cerca de 300 unidades mensais, ou 3.600 por ano, mas ano passado saíram de linha menos de 1.500 unidades. A ideia da marca é tentar atingir novos nichos, como locadoras e produtores rurais, oferecendo o T4 como veículo próprio para rodar no campo ou para explorar rincões pouco convidativos a carros comuns. Com esses novos mercados e com séries especiais, como a Bold, a Troller espera ampliar suas vendas em 15% e chegar às 1.700 unidades este ano.
Impressões ao dirigir
Itupeva/SP – O Troller T4 não é para os fracos. Desde entrar no carro até se acomodar atrás do volante, tudo exige um certo estoicismo do usuário. Tudo é prático, mas nada é fácil ou confortável. Em questão de segundos, mesmo o mais desinformado dos consumidores dos modernos crossover/SUVs percebe que o T4 pertence a outro universo. A suspensão é dura e não ameniza nenhuma irregularidade. É o motorista que se adapta ao carro, e não o contrário. As marchas são duras, a direção é pesada e a estabilidade não transmite a menor confiança em velocidades de estrada.
Quando se encara uma situação de off-road, porém, tudo de justifica. Ângulos de entrada e saída superiores a 50º, capacidade de imersão de até 80 cm e possibilidade de transposição de rampas de até 27% permitem que o Troller chegue a praticamente qualquer lugar. O motor de 200 cv tem grande facilidade de movimentar o jipe, mas o torque de 48 kgfm deveria chegar mais cedo. Ele só aparece com vontade aos 1.750 rpm. Em situações urbanas normais, isso dá boas arrancadas e retomadas – limitadas pela pequena elasticidade do motor diesel da Ford. Mas no off-road, não ajuda muito no controle fino, em baixíssimas velocidades.
Os pneus de uso misto, originais do carro, podem até resolver numa estrada de terra depois de uma chuva leve, mas no off-road na lama, como o que foi feito em Itupeva, ele logo fica encapado pelo barro e para de responder. No off-road pesado, o jeito é instalar pneus Mud. E aí o Troller é capaz de mostrar todo seu potencial esportivo – que não é pequeno. O T4 tem um sistema de acoplamento elétrico da tração e da reduzida, mas toda a transmissão é feita mecanicamente, sem controles eletrônicos. Ou seja: sem ABS “pinçando” a roda que gira em falso.
No teste bolado pela Ford, havia rampas, poças e lamaçais bem pesados enfrentados com valentia pelo T4. A carroceria, com boa capacidade de torção, e a suspensão, de curso longo, conseguem manter o contato dos pneus com o solo, mesmo em desníveis acentuados. Apesar de ser um veículo absolutamente bruto, há alguma condescendência, como a presença de teto-solar dupla, bancos com espuma reforçada e sistema de som com conexão Bluetooth. Mas isso só ameniza o fato de o Troller T4 ser um “off-road de raíz”. Na verdade, um dos últimos da espécie no Brasil.
Ficha técnica
Troller T4 Bold
Motor | Diesel, dianteiro, longitudinal, 3.198 cm³, cinco cilindros em linha, turbo, quatro válvulas por cilindro e sistema de abertura variável de válvulas. Injeção direta e acelerador eletrônico |
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Transmissão | Câmbio manual com seis marchas à frente e uma a ré. Tração integral por acionamento elétrico e reduzida. Não oferece controle de tração |
Potência máxima | 200 cv a 3 mil rpm |
Torque máximo | 48 kgfm a entre 1.750 e 2.500 rpm |
Diâmetro e curso | 89,9 mm X 100,7 mm |
Taxa de compressão | 15,5:1 |
Suspensão | Dianteira e traseira por eixo de torção com barra estabilizadora e barra Panhard. Molas helicoidais e amortecedores de dupla ação. Não oferece controle de estabilidade |
Pneus | 255/65 R17 |
Freios | Discos ventilados na frente e maciços atrás, com ABS e EBD |
Carroceria | Utilitário com carroceria em compósito sobre chassi de longarinas, com duas portas e cinco lugares. Com 4,10 metros de comprimento, 1,98 m de largura, 1,96 m de altura e 2,58 m de distância entre-eixos. Não dispõe de airbags |
Peso | 2.140 kg com 420 kg de carga útil e 750 kg rebocáveis |
Capacidade off-road | 51º de ângulo de entrada e de saída, 27º de inclinação de rampa, 40º de inclinação lateral, 80 cm de capacidade de imersão e vão livre para o solo de 31,1 cm entre os eixos e de 20,8 com sob o diferencial traseiro |
Capacidade do porta-malas | 134 litros/558 litros com os bancos traseiros rebatidos |
Tanque de combustível | 62 litros |
Produção | Horizonte, Ceará |
Lançamento da série | Novembro de 2016 |
Itens de série | Ar-condicionado automático duplo, trio elétrico, computador de bordo, ABS, roda de liga leve escurecida de 17 polegadas, teto solar duplo, pneus de uso misto, direção hidráulica, central multimídia com tela sensível ao toque Kenwood de 7 polegadas, rádio/CD com Bluetooth e navegador Garmin, pintura bitom tipo saia e blusa, |
Preço estimado para a versão | R$ 134 mil |
Autor: Eduardo Rocha (Auto Press)
Fotos: Divulgação